Luanda acolheu recentemente o Angola Forum Peering (AOPF, na sigla inglesa), um evento organizado pelo Grupo de Operadores de Rede de Angola (AONOG, na sigla inglesa) e que visa garantir maior união técnica a nível das empresas de telecomunicações. Durante o evento, conversámos com o presidente da Associação Angolana de Internet (AAI), Sílvio Almada, de modo a ouvirmos de si a sua compreensão do actual estado da internet em Angola e os principais desafios para o futuro.
Portal de T.I (PTI) – Senhor Sílvio Almada, obrigado por aceitar falar ao Portal de T.I. Gostava de começar por ouvir a sua avaliação sobre esta 4ª edição do AOPF.
Silvio Almada (S.A) – Estando na 4ª edição do evento, a avaliação que fazemos é positiva. O AOPF é feito mesmo com o objectivo de termos os operadores de rede a interagirem entre si, porque só assim conseguiremos crescer juntos. Iniciativas destas são realizadas pelo mundo todo e, neste caso, seguimos apenas a tendência do que se faz no resto do mundo.
PTI – Que desafios a indústria da internet em Angola enfrenta nesta altura?
S.A – o principal desafio aqui é a capacitação humana. Temos um país todo para levar a internet e com os poucos técnicos que temos é difícil. Podemos ter boas infra-estruturas, mas precisamos sobretudo de especialistas que preparem as pessoas para utilizá-las e que, simultaneamente, consigam manter essas infra-estruturas todas operacionais. Às vezes ouvimos falar de problemas de sistema e coisas destas, por trás disso há vários factores e um deles é o conhecimento limitado dos técnicos.
Por outro lado, as nossas academias precisam também evoluir ou expandir um pouco mais esses serviços de internet e preparar também técnicos para actuarem a nível das universidades, pois estas instituições praticamente não têm rede própria e nós, enquanto associação, estamos abertos para termos a rede académica no nosso seio.
PTI – O que a AAI tem feito para contribuir no aumento de quadros no país?
S.A – Como sabe, a associação não tem caractér comercial, é uma organização sem fins lucrativos. E os que se prontificam para apoiar são poucos. Temos as empresas, que são os associados, mas nestes há também aqueles que menos contribuem para o crescimento da associação. Portanto, a associação só pode fazer aquilo que está ao seu alcance, temos um rendimento bastante limitado, não podemos fazer muito. Somos donos de um IXP em que todos os operadores são associados, mas mesmo entre os associados há alguns que não pagam as suas cotas.
PTI – De que forma o Estado pode contribuir a superar esta dificuldade?
S.A – Um fundo alocado pelo Estado para o desenvolvimento das telecomunicações seria de grande ajuda. Porque, com isso seria possível criar uma academia da Associação Angolana de Internet, o que nos ajudaria a criar mais formações e a preparar mais quadros para assegurar o futuro da internet em Angola. Nós temos boas relações com as organizações internacionais, como a ISOC e a AFRINIC, por exemplo, portanto com uma academia aqui conseguiríamos preparar formadores capazes de expandir este conhecimento a nível nacional.
PTI – A associação já formalizou essa preocupação junto das autoridades?
S.A – Não, ainda não demos nenhum passo. Mas, a associação é parceira do Estado e o que se passa na associação deve ser do seu domínio, porque boa parte das empresas que são nossos associados são também empresas do Estado. Nós fazemos o que é de interesse comum, como a partilha, que tem a ver com o crescimento e que serve para empoderar a todos os que estão no ecossistema de internet.
PTI – Falou agora da partilha e por isso pergunto-lhe: de que forma a partilha de conhecimentos pode impulsionar o ecossistema de internet em Angola?
S.A – Nós aqui somos muito reservados, parece que os nossos técnicos sentem medo de partilhar informações, parece que estão sempre do lado oposto, parece que temem que o colega do outro lado também saiba um pouco do que ele sabe. Então tratam de esconder as informações. Esses são comportamentos nocivos ao ecossistema, pois quanto mais sabemos e partilhamos mais crescemos. Não adianta crescermos sozinhos, enquanto os outros vivem na ignorância, senão teremos um país desagradável para se viver.
Portanto, eventos como o AOPF são positivos. Porque, em lugares como este encontramos sempre alguém que sabe mais do que nós. Temos aqui vários operadores de rede que tiveram problemas nas suas redes e outros desafios ao longo do ano, então agora é o momento de partilhar. Temos de estar sempre abertos e humildes para aprender e podermos crescer, não individulamente, mas como sociedade.
PTI – Já para terminar. Considera oportuna a adopção do IPV6 em Angola?
S.A – Sim. Acho que todos os operadores aqui presentes têm recebido as mensagens de que se não utilizarem os IPs que foram alocados podem perdê-los, mas muitos não levam as coisas a sério, só estão a olhar para o presente. Chegará o momento em que quem não tiver o IPV6 ficará fora do ecossistema. Neste momento, a comunicação ainda pode fluir, devido às soluções de linha dupla que permitem que os equipamentos funcionem tanto com o IPV4 quanto com o IPV6, mas chegará a altura em que a comunicação será apenas por IPV6.
PTI – Permita-me adicionar mais uma questão: qual seria o impacto da adopção do IPV6 em Angola?
S.A – Quando foi criado o IPV4 não foi tido em conta o crescimento massivo da internet que vemos hoje, por isso foi necessário criar uma versão que melhor atendesse às necessidades actuais. O IPV6 vai tornar possível a internet das coisas e outros serviços que sem a sua adopção serão impossíveis de utilizar no futuro. Ou seja, o IPV6 é o futuro.
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